Pular para o conteúdo principal

Consciência, educação e visibilidade

Foto de Januário Garcia, presente no livro "1980/2005 – 25 anos do Movimento Negro do Brasil"

Neste Dia da Consciência Negra, e nem só nele, penso que a principal questão que se apresenta aos afrodescendentes é a da representatividade. Ainda que sejamos metade da população brasileira, a sensação de invisibilidade é algo que nos assombra desde sempre. Tive a sorte de ter pais envolvidos no movimento negro dos 1970 e 1980 e por conta disso a informação a respeito dos meus pares, figuras primordiais para a construção da identidade brasileira, estiveram ao meu alcance. Diferente da maioria dos garotos e garotas de minha etnia que ainda hoje aprendem nas aulas de História que em dado momento chegaram aqui uns escravos trazidos de um lugar exótico chamado África. Sujeitos que eram comercializados em praça pública, trabalhavam feito mulas, habitavam as senzalas, tomavam umas chicotadas durante o expediente, criaram a capoeira e a feijoada. Grosso modo, é assim que os negros aparecem nos livros escolares. Evidentemente, não há como se identificar com isso. E pobres daqueles que, ainda nos verdes anos, não têm a ciência da complexidade do tráfico negreiro, da atuação dos quilombolas, dos embates constantes entre abolicionistas e senhores de escravos, da pela escura – branqueada pelo eurocentrismo caboclo oficial - de gente como o jornalista abolicionista José do Patrocínio, o engenheiro André Rebouças(sim, o que da nome à avenida Rebouças), o psiquiatra Juliano Moreira (fundador da Sociedade Brasileira de Psiquiatria), o poeta Cruz e Souza, o escritor Machado de Assis, o presidente da República Nilo Peçanha (governo de 1909 a 1910), entre tantos outros (reparem nas atividades diversas dos nomes citados). Sem referencial não dá para ter autoestima. Nessa toada, educação e visibilidade são as palavras de ordem para a negrada do século 21. E eu quero ver quando Zumbi chegar. Eu quero ver.

Comentários

Raphael disse…
arrepios..."eu também quero ver"
Anônimo disse…
Oi Rodrigo,

Que texto emocionante e direto, sem meias palavras. As minhas crianças procuram personalidades negras importantes na história, justamente para conhecê-las e reconhecê-las. Apresentei o professor Milton Santos e contei um pouco da trajetória dele e tb, meu professor, e de outras personalidades, como Carlos Gomes, Teodoro Sampaio e Mestre Didi. Agora, rumo ao Museu Afro Brasil, com o marailhoso Emanuel Araújo, que criou um Baobá, lindo. Essas crianças não serão as mesma...Bj


Julieta
rodrigo carneiro disse…
Que maravilha. Leva a criançada pro museu, querida. Encontrei o Emanuel Araújo no elevador do prédio de um amigo uma vez. Timidez é uma desgraça. Até hoje me arrependo de não ter trocado palavra com ele. Beijaço.
Marie Ange disse…
falou tudo moço!
educação / consciência/ respeito.
beijos coloridos

Postagens mais visitadas deste blog

Escovinha ou função, um breve estudo sociológico

'Back in black' (1986), do Whodini; “I’m a ho!” é a quarta faixa do álbum Dia desses, no Facebook, o amigo Neco Gurgel postou uma música do Whodini, a clássica “I’m a ho!”. Nos bailes black de periferia, o refrão da faixa era conhecido e sobretudo cantado como “Desamarrou (e não amarrou)”. Paródias do tipo eram bastante comuns naqueles tempos, final dos anos 1970, começo dos 1980. Na tradução marota da rapaziada, o funk "Oops upside your head", da Gap Band, por exemplo, ficou informalmente eternizada como "Seu cu só sai de ré". Já “DJ innovator”, de Chubb Rock, era “Lagartixa na parede”- inclusive gravada, quase que simultaneamente, por NDee Naldinho, em 1988, como “Melô da lagartixa”. A música do Whodini, lançada em 1986, remete a um fenômeno que tomou as ruas do centro de São Paulo, e periferias vizinhas, antes da cultura hip hop se estabelecer de fato: o escovinha, também chamado de função. Em “Senhor tempo bom”, de 1996, os mestres Thaíde & DJ Hu