O escritor Jack Kerouac
Impossível escapar dos enigmas. Que nem as pessoas sorriem nas cantinas quando elas chegam e sentam na mesa mas na hora de ir embora, quando as cadeiras arrastam no piso em uníssono e elas pegam os casacos e as coisas com um olhar carrancudo (todos no mesmo nível de semicarrancudice que é uma carrancudice especial de frustração porque a promessa feita pelo sorriso na chegada não se cumpriu ou se se cumpriu morreu em seguida) – e durante essa vida curta que tem a mesma qualidade cega inconsciente do orgasmo tudo acontece com as almas delas – é o GRANDE MOMENTO – a soma dos ápices dos relacionamentos humanos – dura um segundo – a mensagem vibratória a toda – mas também não é tão mística assim, é o amor e a sintonia num clarão. É assim que a gente que pira a noite de tudo quanto é jeito (surubas com quatro pessoas, conversas de três dias, viagens transcontinentais ininterruptas) também sente essa carrancudice temporária que nos avisa que é hora de ir dormir – nos lembra que dá para parar com isso – e nos lembra mais ainda que o momento é incapturável, já passou e se a gente dormir dá para reviver ele e fazer mil outras combinações e misturas lindas – embaralhar os velhos arquivos da alma num sono demente alucinado – Então as pessoas na cantina têm que olhar mas só até pegarem o chapéu delas, porque a carrancudice também é um sinal que elas mandam umas para as outras, um tipo de “Boa-noite senhoras” ou talvez uma gentileza interior do coração. Que tipo de amigo ia rir na cara dos amigos na hora de pegar o casaco fazendo uma carranca e de se curvar para ir embora? Esse gesto significa “Estamos indo embora dessa mesa que tinha prometido tanto – é nosso tributo aos tristes”. A carrancudice continua assim que alguém diz alguma coisa e eles se dirigem até a porta – rindo eles atiram ecos de volta à cena do desastre humano – e descem a rua no ar renovado que o mundo providencia. Ah, os corações loucos de todos nós!
Trecho de Visions of Cody, livro de Jack Kerouac. Muito bem lembrado pelo brother Marcelo Montenegro.
Impossível escapar dos enigmas. Que nem as pessoas sorriem nas cantinas quando elas chegam e sentam na mesa mas na hora de ir embora, quando as cadeiras arrastam no piso em uníssono e elas pegam os casacos e as coisas com um olhar carrancudo (todos no mesmo nível de semicarrancudice que é uma carrancudice especial de frustração porque a promessa feita pelo sorriso na chegada não se cumpriu ou se se cumpriu morreu em seguida) – e durante essa vida curta que tem a mesma qualidade cega inconsciente do orgasmo tudo acontece com as almas delas – é o GRANDE MOMENTO – a soma dos ápices dos relacionamentos humanos – dura um segundo – a mensagem vibratória a toda – mas também não é tão mística assim, é o amor e a sintonia num clarão. É assim que a gente que pira a noite de tudo quanto é jeito (surubas com quatro pessoas, conversas de três dias, viagens transcontinentais ininterruptas) também sente essa carrancudice temporária que nos avisa que é hora de ir dormir – nos lembra que dá para parar com isso – e nos lembra mais ainda que o momento é incapturável, já passou e se a gente dormir dá para reviver ele e fazer mil outras combinações e misturas lindas – embaralhar os velhos arquivos da alma num sono demente alucinado – Então as pessoas na cantina têm que olhar mas só até pegarem o chapéu delas, porque a carrancudice também é um sinal que elas mandam umas para as outras, um tipo de “Boa-noite senhoras” ou talvez uma gentileza interior do coração. Que tipo de amigo ia rir na cara dos amigos na hora de pegar o casaco fazendo uma carranca e de se curvar para ir embora? Esse gesto significa “Estamos indo embora dessa mesa que tinha prometido tanto – é nosso tributo aos tristes”. A carrancudice continua assim que alguém diz alguma coisa e eles se dirigem até a porta – rindo eles atiram ecos de volta à cena do desastre humano – e descem a rua no ar renovado que o mundo providencia. Ah, os corações loucos de todos nós!
Trecho de Visions of Cody, livro de Jack Kerouac. Muito bem lembrado pelo brother Marcelo Montenegro.
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