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Lendo Hilda Hilst



A cineasta Gabriela Greeb está finalizando "Hilda Hilst pede Contato", um longa-metragem, híbrido de documentário e ficção, sobre as experiências de uma das maiores escritoras brasileiras no campo da transcomunicação instrumental (grosso modo, o diálogo entre vivos e mortos através de aparelhos eletrônicos). A diretora convidou algumas pessoas para interpretações de trechos da robusta produção de Hilda. O registro das vozes surgirá em determinados momentos do filme. Tenho o privilégio de ser um dos convidados. Entre outros escritos que tive a oportunidade - e o deleite - de narrar está “Ama-me”, poema maravilhoso que não me sai da cabeça desde então.

"AMA-ME

Aos amantes é lícito a voz desvanecida.
Quando acordares, um só murmúrio sobre o teu ouvido:
Ama-me. Alguém dentro de mim dirá: não é tempo, senhora,
Recolhe tuas papoulas, teus narcisos. Não vês
Que sobre o muro dos mortos a garganta do mundo
Ronda escurecida?

Não é tempo, senhora. Ave, moinho e vento
Num vórtice de sombra. Podes cantar de amor
Quando tudo anoitece? Antes lamenta
Essa teia de seda que a garganta tece.

Ama-me. Desvaneço e suplico. Aos amantes é lícito
Vertigens e pedidos. E é tão grande a minha fome
Tão intenso meu canto, tão flamante meu preclaro tecido
Que o mundo inteiro, amor, há de cantar comigo."


(Dos anos 1950, a foto que ilustra o post é de Fernando Lemos)

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