Escrevi “Fênix hesitante” a pedido da novíssima banda Bufo Borealis, cujos idealizadores são os músicos e compositores Rodrigo Saldanha (bateria) e Juninho Sangiorgio (baixo, piano elétrico e guitarra). Grandes figuras. O poema transformou-se na faixa de abertura do disco de estreia deles, “Pupilas horizontais”, que começou a ser divulgado no sábado, 23. Fernanda Lira divide os vocais comigo e Anderson Quevedo responde pelo sax tenor. No decorrer dos dias, as demais composições virão à baila. A íntegra do disco estará disponível em todas as plataformas digitais muito em breve. Eis o poema. Agradecido pelo convite, desejo toda sorte ao lance. E, a propósito do escrito, qualquer semelhança com a tragédia brasileira não é mera coincidência.
FÊNIX HESITANTE
Há uma terra em transe fundamentada na exploração física e mental.
Entradas e bandeiras do genocídio.
Há um imenso território cujos habitantes primordiais foram - e são -
dizimados em nome do progresso civilizatório.
E o nome de Deus sempre envolvido.Há os 300 anos de tráfico negreiro, a abolição pífia e seus reflexos reluzentes no agora.
Há a tradicional ideia do país do futuro que ignora solenemente o presente e o passado.
Há os planos econômicos e os lucros estratosféricos dos bancos.Os miseráveis e os privilegiados determinados a nunca largar o osso.
Há os períodos democráticos pontuados por totalitarismos tropicais.
Há os conluios, os combinados prévios que preservam cabeças e cargos,
a constância dos favores trocados, a impunidade e o peso de duas medidas.
O abuso, a desfaçatez, os estômagos embrulhados, as táticas de guerra entre narrativas.
Há um país que, reduzido às cinzas, acaba uma série de vezes. Renascendo dos resquícios com as asas de Fênix hesitante diante do abismo.
Via Facebook, o amigo Gunter Sarfert lembrou de sequência maravilhosa de um dos meus filmes brasileiros preferidos, Os Sete Gatinhos (1980), de Neville d'Almeida, baseado na obra de Nelson Rodrigues.
Comentários